Jorge Bento e Marta Quaresma Ferreira em 2023-9-20

ENTREVISTA

Tem A Palavra - Dez anos depois

“Só sobrevive neste mercado quem tem uma capacidade de reinvenção e de aprendizagem fora do normal”

A primeira edição do IT Channel, em setembro de 2013, contou com Isabel Reis como principal entrevistada. Dez anos depois, e nesta edição especial, a agora General Manager da Dell Portugal volta a ter a palavra para uma viagem no tempo e uma reflexão sobre as grandes mudanças ocorridas na última década no mercado de IT em Portugal e a nível mundial

“Só sobrevive neste mercado quem tem uma capacidade de reinvenção e de aprendizagem fora do normal”

Isabel Reis, General Manager da Dell Portugal

Como descreveria as principais mudanças no mercado de tecnologia de informação nos últimos dez anos?

É um mercado que está sempre a reinventar- se e que anda muito mais rápido que, eventualmente, outros segmentos de mercado. Lembro-me que houve uma variável que teve um boom há dez anos que fez com que o mundo ficasse mais global, relacionada com as redes sociais, a internet, o Internet of Things. O online apareceu em força. Começou a implementar-se o trabalho remoto em que era possível trabalhar de qualquer parte do mundo para diferentes países, utilizando as ferramentas de colaboração. Surgiu o as-a-Service em força, fruto do aumento das vendas online. As redes sociais em si deixaram de ser um ponto de encontro entre pessoas conhecidas e não conhecidas para passarem a ser um veículo de publicidade. Aqui começa toda a necessidade de implementar ferramentas que pudessem definir perfis de consumidor, que pudessem dar muito mais ferramentas às empresas e, obrigatoriamente, fazer com que tivessem em conta um determinado volume de negócios ou uma fonte de receita que não era a habitual e que cresceu. Começou-se a falar em inteligência artificial e realidade aumentada, blockchain e tudo isto fez com que o mundo ficasse diferente.

É mais ou menos nesta altura que surge aquilo a que chamamos de quarta revolução industrial. Foi absolutamente incrível e obrigou a que todas as empresas que estão nas áreas das Tecnologias de Informação se reinventassem mais uma vez, criassem infraestruturas de software e hardware que pudessem acompanhar estas novas dinâmicas. A velocidade tornou-se chave para o sucesso das companhias. Com tudo isto vem a necessidade de começar a implementar ferramentas de proteção de dados e de cibersegurança porque, como tudo na vida, há dois lados da mesma moeda e o mundo mais global também trouxe um mundo mais perigoso.

O mercado de Parceiros é hoje mais complexo do que há dez anos. Há mais players relevantes ou, pelo contrário, há mais consolidação?

Os Parceiros que não foram capazes de se reinventar, de se adaptar e de se transformar de modo a poderem, em conjunto com os fornecedores, ser um facilitador e um implementador e estar junto do cliente para ajudá-lo exatamente na transformação digital, não sobreviveram. Nos últimos dez anos houve muitas empresas Parceiras da Dell – e sem ser Parceiras – que fecharam portas. Os que sobreviveram tornaram- se mais fortes, mais capazes, são fundamentais, na nossa perspetiva, para conseguir ter soluções chave na mão para os nossos clientes. O mercado está um bocadinho mais consolidado, mas isto é um ciclo: consolidam-se, separam- se, consolidam-se, separam-se. Aparecem novas entidades, umas resistem outras não; temos Parceiros que se consolidaram em grupo porque foram adquiridos e isso terminou numa consolidação de competências: empresas que eram mais fortes em áreas de suporte técnico; outras que eram mais fortes na área de implementação daquilo que é o posto de trabalho; outras que eram mais fortes na implementação de serviços para gestão ou desenvolvimento aplicacional. Todas essas empresas acabaram por se reinventar e hoje estão mais fortes. Algumas ficaram pelo caminho ou porque não foram capazes, ou porque não tiveram capacidade de investimento ou não conseguiram descortinar o que vinha por aí. É muito difícil antecipar ao dia de hoje como é que vai ser o mercado das Tecnologias da Informação daqui a cinco anos, mas a verdade é que há algum planeamento, alguma visão estratégica e apostas que se têm de fazer para nos prepararmos para o futuro.

Como é que a Dell usou os avanços tecnológicos dos últimos anos a seu favor, nomeadamente ao nível dos produtos e serviços que disponibilizou aos seus clientes?

Às vezes há alguma perceção no mercado de que a cloud e a inteligência artificial podem tirar espaço a uma empresa como a Dell, quando é absolutamente o contrário. O que a Dell fez relativamente a essa tendência de mercado foi criar soluções que permitem liberdade de escolha para os clientes quando estão a implementar uma solução de cloud e possibilidade de investir em clouds em sistemas multiclouds e em clouds híbridas, ou seja, ter parte dos workloads na cloud pública e outra numa cloud privada e poderem fazer movimentação de dados entre elas sem estarem aprisionadas. É necessário que haja uma camada de software e hardware que permita aos clientes atuarem rapidamente dentro dessa estratégia sem ter impacto no negócio. A cloud não veio prejudicar ou complicar o negócio da Dell – veio, por outro lado, criar soluções dentro da companhia e dar liberdade de escolha aos clientes.

Relativamente à inteligência artificial, vai começar a assistir-se a alguma eventual substituição de postos de trabalho por IA, aparentemente situações em que há uma atividade que é mecanizada ou repetitiva. Por outro lado, a IA serve para conseguirmos ter cada vez mais conhecimento mais detalhado. Isto, claro, tem o outro lado da moeda: a invasão da privacidade é cada vez maior.

                                                                                                                                                                                    
 

“Os Parceiros que não foram capazes de se reinventar, de se adaptar e de se transformar (…) não sobreviveram”

A IA e todas estas novas tecnologias de machine learning são muito interessantes e podem trazer fontes de receita adicionais à companhia, mas também têm exigências a nível de investimento no que diz respeito à tecnologia e a Dell está lá para ajudar os clientes nesse sentido.

Numa era de crescente ameaça, como é que a Dell tem reforçado as suas soluções de proteção de dados para garantir a confiança e segurança dos clientes?

A cibersegurança está na agenda dos clientes e será o primeiro tópico da agenda de todas as companhias que têm negócios online ou não. Uma certeza é a de que os ataques acontecem diariamente. Grande parte deles não são executados porque ‘batem’ em várias barreiras de segurança que as companhias implementaram, mas é público que muitos deles têm conseguido atingir os seus intentos e provocado alguns danos, não só a nível da informação que conseguem aceder, mas também a nível reputacional. Ainda há empresas que acham que o facto de terem um sistema de backup implementado ou mesmo um sistema de disaster recovery as deixa preparadas para um caso de ataque cibernético. Se a informação está na rede ou se passa na rede, ela está acessível a qualquer ataque e, portanto, não é por termos um sistema de reparação de informação que vamos conseguir manter o nosso negócio a funcionar porque, provavelmente, os dois sistemas estarão corrompidos. A única maneira, e é aqui que entra a Dell, é ter um posicionamento de mercado a nível de soluções de cibersegurança, também em conjunto com outros Parceiros do mercado. Nós temos muitos clientes em Portugal e internacionalmente que já investiram em soluções de cibersegurança, exatamente porque a Dell consegue proporcionar aquilo a que chamamos de um ‘cofre de informação’ que é completamente inviolável. A Dell tem estado ao lado dos seus clientes, em conjunto com os Parceiros, que têm um papel fundamental na consultoria prévia do que vamos definir, da informação que não podemos deixar de ter disponível em caso de um ciberataque. É um tema que vai ser cada vez mais relevante para a sobrevivência do negócio. É muito importante ter uma estratégia interna, comercial e de marketing que permita desenvolver novos produtos de acordo com os perfis dos potenciais clientes e consumidores, mas se não tivermos uma política de segurança mais ou menos robusta podemos arriscar a que a empresa e o negócio desapareçam por perda irrecuperável da informação que é crucial para a companhia.

Olhando para o futuro, quais são as principais tendências que a Dell identifica no mercado de tecnologia da informação e como é que a organização planeia o posicionamento diante destas mesmas tendências?

Não são tecnologias novas, mas são tecnologias que vão ter um boom extraordinário como é a inteligência artificial e o machine learning. A inteligência artificial vai poder fazer muita coisa que se fazia no mundo físico. A distinção entre o que é real e o que não é vai ser cada vez mais difícil.

Neste momento, daquilo em que a Dell tem investido e está a investir cada vez mais, estão soluções cloud, naquilo que tem a ver com implementações na parte dos clientes de estratégia de cloud; o data center físico não desapareceu e vai continuar a existir, até por questões regulamentares é preciso continuar a ter informação on-prem e é preciso que essa informação esteja segura e em ambiente acessível. A cibersegurança, a cloud, a IA, o machine learning e o blockchain são tudo tecnologias que exigem níveis elevadíssimos de processamento, software cada vez mais inteligente na deteção de eventos anormais e, na verdade, é uma incógnita o que é que tudo isto vai gerar.

                                                                                                                                                                                    
  “O Parceiro que queira estar em funções e no mercado daqui a dez anos tem de ter uma capacidade de transformação interna, de resposta e alguma visão que lhe permita acompanhar estas alterações”                          

O as-a-Service é uma tendência fundamental no consumo da tecnologia que veio para ficar. Acho que vai ser uma tendência muito acentuada nos próximos cinco anos do ponto de vista de crescimento. Até para os clientes, pela dificuldade na previsão de como é que os sistemas vão evoluir e dos recursos que vão necessitar em função da evolução tecnológica e da necessidade de manter um negócio sempre a funcionar, com recursos sempre disponíveis.

Os Parceiros têm os mesmos desafios que nós temos tido. Nós disponibilizamos duas soluções de as-a-Service - uma está integrada na outra - mas são ligeiramente diferentes: o Apex e o Flex on demand. Tivemos o cuidado de que os nossos Parceiros pudessem utilizar estas soluções para eles próprios integrarem as soluções. Se o nosso cliente decidir que quer um as-a-Service, o nosso Parceiro está preparado para fornecer exatamente essa solução num modelo as-a-Service, utilizando as ferramentas que a Dell disponibiliza. Os sistemas as-a-Service vão permitir a renovação tecnológica sem que o cliente tenha custos elevados ou tenha de pedir budgets adicionais para fazer essa renovação tecnológica.

Não podemos ignorar o crescimento exponencial do as-a-Service que vem exatamente na linha de todas estas alterações, novidades e necessidades que os clientes vão demonstrando, fruto das novas tecnologias que já falámos. O negócio online, o digital, tudo isto veio trazer exigências muito grandes às empresas e dificuldades em prever o que é que vamos precisar daqui a um ano, dois ou três.

Como é que será um Parceiro de IT dentro de dez anos?

O Parceiro que queira estar em funções e no mercado daqui a dez anos tem de ter uma capacidade de transformação interna, de resposta e alguma visão que lhe permita acompanhar com rapidez todas estas alterações.

Os Parceiros têm de estar muito perto do cliente e isso é fundamental para sobreviverem daqui a dez anos porque são eles que vão saber, em primeira mão, aquilo que os clientes estão a pensar e quais são as necessidades que vão tendo ao longo do tempo. Depois têm de ter uma capacidade de se reinventarem e de se adaptarem. Há uma coisa que não mudou em todos estes anos: só sobrevive neste mercado quem tem uma capacidade de reinvenção e de aprendizagem fora do normal porque é uma área de mercado que anda muito rápido e que é muito exigente, até a nível de conhecimento. Se esse Parceiro tiver cá daqui a dez anos foi porque ele teve as soft skills, mais do que o resto, para sobreviver. Se hoje as transformações digitais levam a que o online e o negócio digital tenham o peso que têm, daqui a dez anos vai ser fundamentalmente o negócio principal. É preciso ter muita competência interna para poder responder em termos de serviços, até porque os Parceiros vivem essencialmente da capacidade dos serviços que implementam quando estão a trabalhar com os clientes. Os Parceiros que tiverem mais capacidade, que estiverem mais junto do cliente, são aqueles que vão sobreviver. Os que estiverem exclusivamente à espera de que o negócio caia não vão sobreviver.

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