2015-5-13

ENTREVISTA

“Há muito mais tecnologia do que aquela que estamos a explorar”

Os modelos de utilização tecnológicos estão a mudar e a Intel está no centro desta transformação. Alexandre Santos, business manager da Intel em Portugal, apela a uma mudança das próprias empresas do Canal de TI, para que passem de um modelo transacional para um modelo de valor. Só assim, diz, será possível extrair da tecnologia tudo o que ela tem para nos oferecer

“Há muito mais tecnologia do que aquela que estamos a explorar”

Alexandre Santos, business manager da Intel em Portugal.

IT Channel – Durante a apresentação à imprensa da 5ª geração de processadores Intel Core vPro, no início deste ano, disse que “existe mais tecnologia do que capacidade para a entender”. Era um apelo às empresas de TI?

Alexandre Santos – Estamos num processo ainda de mudança, do modelo transacional para o modelo de adicionar valor. Quando nos projetamos a médio longo prazo, temos que pensar em valor. Temos que perceber o que estamos a adicionar em termos de valor, na nossa própria cadeia de serviço, para que nos reconheçam como um diferenciador. Acho que essa é a grande diferença em relação ao que existe hoje. Muito do que ainda assistimos atualmente está relacionado com o processo transacional, que é a implementação de tecnologia, “pura e dura”. Sim, integra-se, implementa-se e fazem-se desenvolvimentos, mas não se está a adicionar esse valor. O cliente quer renovar, porque já existem outras tecnologias, mas isso não está a ser feito com a mesma velocidade com que é solicitado. A 5ª geração de tecnologia Intel Core tem, efetivamente, mais tecnologia do que aquela que está a ser explorada.

As empresas estão preparadas para isso?
Diria que não. Estou a pedir atualmente um conjunto de ações, ao mercado, que estão relacionadas com o workplace transformation, que está relacionado com as futuras gerações que vão chegar ao mercado de trabalho. São mais informadas, formadas tecnologicamente, mais maduras em termos de conhecimento. São os millenials ou Z, que vão ocupar uma franja importante dos postos de trabalho do futuro. Essas pessoas têm fatores de mobilidade muito maiores do que os atuais empregados, porque não vivem sem o seu próprio dispositivo móvel. A tecnologia está a assessorar tudo isto e diria que as empresas não estão a este nível. Essa é a minha crítica. Porque hoje falamos muito de acessos remotos aos equipamentos, mas depois não existe o ecossistema, a infraestrutura que dê apoio a tudo isto. A tecnologia existe, a intenção e a boa vontade dos utilizadores também, mas depois falta toda a parte de integração. Os system integrators são necessários para a adaptação estas tecnologias.

E estão a receber a mensagem?
Nós, fabricantes, temos uma quota de responsabilidade em tudo isto. Temos que trabalhar o mundo corporativo, o mundo das PMEs, e fazemo-los através de ações de Canal, mas só falamos de volume, porque não sabemos qual é o nosso público alvo, que é para nós indiferenciado. Sabemos que há uma consequência das nossas ações, em termos de volume, mas se estivermos a falar de valor não estamos a falar do mesmo.
E o Canal é forte por isso, porque consegue essa cobertura ampla. O que é curioso é que o mercado se está a transversalizar e ao mesmo tempo a especializar. Isso temos notado. Os nossos integradores estão a especializar-se em sectores onde são fortes. Isso é benéfico porque é nessa especialização que existe essa diferenciação e esse valor. Não tem sido fácil, porque é um trabalho que na realidade pode ser definido como uma maratona.
Nós projetamos uma estratégia que tem um conjunto de táticas para chegar aos mercados, mas algumas não são fáceis de implementar. Por exemplo, a gestão remota. Ela existe em quase todos os equipamentos vPro, desde os upgrades aos antivírus, mas não é ativado desde a venda porque existe um custo, mas também devido a um compromisso do próprio integrador, que passa por estar presente no local. Se este ativa a função remota, está a colocar em causa a sua própria presença...

Crê que as empresas do Canal de TI se sentem de algum modo ameaçados pela própria tecnologia?
Sim, pelo desenvolvimento da tecnologia, que está bastante mais avançado. Isso é uma verdade. Porque nós observamos que estas tecnologias têm todo este potencial, mas muitas vezes acabamos por subestimá-las. O que acontece é que estamos a explorar apenas submodelos de uso. Quando existem vários. Em termos tecnológicos estamos a comercializar a última tecnologia, que é escalável, só que acabamos por ficar-nos por modelos de uso mais elementares.

Que alterações vai produzir a chegada do Windows 10? Terá, por exemplo, autenticação biométrica, e poderá impulsionar a exploração de outras funcionalidades...
Essa autenticação, por exemplo, deve-se ao desenvolvimento da nossa câmara 3D Real Sense, que permitirá identificar as pessoas pelas dimensões do próprio rosto, que é composto por um conjunto de traços. O computador acaba por conseguir identificá-los de um modo tridimensional, o que garante uma maior segurança, porque caso contrário bastava mostrar uma fotografia para desbloquear o PC.
Na prática, a Intel está a explorar um modelo de uso, o tal workplace transformacional. Porque a câmara, em si, para o cliente final não significa nada. Mas se explicarmos aos utilizadores o efeito que tem em termos de segurança...
O Windows 10 vai despoletar, sim, um conjunto de mudanças em relação a outros modelos de uso, nomeadamente o aplicacional.

E o que implicará em termos da renovação dos vossos próprios processadores?
Em outubro teremos um tok, ou seja, vamos manter os 14 nanómetros, mas proceder à alteração da arquitetura, do desenho do chip. Neste tok vamos ter um novo produto, o Skylake, abandonando o Broadwell. Vamos sofrer uma transição, que terá que ser falada, porque o Windows 10 será grátis. Em termos corporativos não deve representar um problema. Nas PMEs pode haver um compasso de espera e algum impacto. Na Intel estamos por isso a tentar explicar ao mercado que deve fazer o refresh e não temer o Windows 10.
Num ano teremos, assim, três transições: o Broadwell sem Windows 10, Broadwell com Windows 10 e Skylake com Windows 10. Não é habitual, mas tentaremos passar uma mensagem positiva. Acreditamos que no mercado SMB possa trazer algum delay de decisão, mas apelamos a que isso não os limite, porque o update será um processo simples.

Como é atualmente o relacionamento da Intel com a indústria OEM em Portugal?
Trabalhamos com todos os local OEMs que temos em Portugal e que têm uma dinâmica completamente diferente das multinacionais. Há até um facto curioso. O ano passado foi o ano da renovação do desktop e, curiosamente, havia um par de players no mercado a funcionar bem: uma multinacional e um local. Quando não ganhava um, ganhava o outro. O local tinha a capacidade de poder ser uma alternativa, o que demonstra uma dinâmica muito apelativa, que se justifica pela proximidade ao mercado e aos verticais. Essa é a questão mais importante e leva-nos à anterior, do valor.
E os OEMs locais não se ficam pelo PC, abrangem digital signage e, no futuro, a IoT. Hoje o OEM local não tem uma dinâmica cingida ao PC, é muito mais lata, porque a multinacional está limitada pela casa mãe, o que dá aos locais uma maior capacidade de adaptação. Aliás, nos PCs observo uma oferta muito próspera no mainstream, por parte dos OEMs. As entradas de gama são dominadas por dois players, a Asus e a Acer. No high end e híbridos, a Microsoft tem vindo a afirmar-se com os Surface. Acho que, no meio, esse espaço será ocupado pelos OEMs locais, que têm a capacidade de apetrechar os equipamentos com outras dinâmicas financeiras. Um local consegue abdicar de um conjunto de tecnologias para colocar o produto naquele ponto-preço. Atualmente temos um processo de adaptação a um novo modelo de utilização, os dois-e-um ou híbridos, que não são um produto de compra por impulso, nem affordable, mas são os que apelam ao refresh. O clamshell continua a ser uma oferta mais legítima em termos de ponto-preço.

Como vê a Intel o futuro do PC? De acordo com os últimos resultados divulgados, esta divisão sofreu uma quebra no seio da empresa...
Está a existir uma transferência de modelos de uso. Quando falamos de PC, o modelo de uso diversificou-se porque o refresh estagnou. Estamos a faturar menos nesta área porque o preço médio de venda baixou substancialmente. A nossa Lei de Moore prevê ainda dez anos de continuidade sobre isto.
Na prática, na Intel estamos a vencer numa área diferente da que endereçávamos tradicionalmente. Se o modelo de uso hoje acontece através de um smartphone – e não estamos tão prósperos nesta área como gostaríamos, lá chegaremos – na prática estamos a providenciar todos os conteúdos que o smartphone usa, porque estamos do lado da infraestrutura.

A Lei de Moore, celebrou, aliás, os seus 50 anos recentemente, havendo quem lhe sentencie um fim...
Não tem um fim à vista, pelo contrário. É uma regra que a indústria de semicondutores adotou para fazer uma renovação tecnológica, que impele também um determinado tipo de consumo. Os fabricantes obrigam-se a produzir para um mercado que entende a obsolescência das suas tecnologias e, por isso, se renovam. Será possível a Lei continuar a vigorar nos próximos 10 ou 50 anos? Diria que sim, mas em perspetivas diferentes, porque estamos a chegar aos 14 nanómetros. Quando fizemos um transístor tridimensional acabámos por ganhar muita flexibilidade em termos de Lei de Moore, porque ainda estamos só no início do tridimensional, o que significa que posso colocar camadas de transístores, umas em cima das outras, a três dimensões. A Lei de Moore está para ficar e isso significa que podemos fazer outro tipo de coisas, nomeadamente outro tipo de tecnologias, como por exemplo as biológicas.

Para onde caminha a tecnologia?
A Intel projeta-se no futuro, mas há muita tecnologia presente que tem que ser maturada. Temos que explorar melhor os modelos de uso atuais e tentar implementar muita da tecnologia que hoje é disponibilizada pelos meios que estão ao nosso alcance e que nós desconhecemos. Há muito mais tecnologia do que aquela que estamos a explorar. Claro que a tendência é a miniaturização, mas a Intel prevê o futuro sob uma perspetiva de ecossistema, sobretudo no que diz respeito à IoT. Falamos desta tendência numa perspetiva de ecossistema e transformacional, ou seja, em que medida afeta o futuro de uma empresa. Aportar inteligência ao sistema é inovação. Isto é o futuro, mas um futuro que já está a acontecer.
Há aqui um aspeto relevante, que é o tipo de informação que estamos a gerar, muito diferente da do passado. Os dados outrora eram estruturados e agora não o são, com origem em fontes totalmente diversificadas. Tal como os modelos de uso tecnológico tiveram que se adaptar a nós, e não ao contrário, o mesmo está a acontecer com o tipo de informação.

Extrair informação em tempo real é o maior desafio, neste contexto?
Sim. Quando falamos de futuro, falamos de prepararmo-nos para conseguir recolher a mais-valia da informação e monetizá-la. O valor em tempo real chama-se Big Data, porque não o for chama-se só data analytics. A Intel está a participar em todo o back end de tudo isto, potenciando a previsibilidade do Big Data, que transforma tudo num modelo económico diferente – passamos de um modelo de transação para o modelo de serviços com valor, o tal diferenciador de negócio. É aqui que o Canal tem de estar, na cadeia de valor e no valor acrescentado. E voltamos ao modelo de uso do PC – vender o PC, instalá-lo e assegurar a sua manutenção ou acrescentar serviços? Esta última parte é que faz a grande diferença.

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